É incrível quando percebemos o potencial de uma proposta simples e despretensiosa.
No ano passado, participei, em ações sociais da cidade em que moro, representando o Coletivo Feminista MariEllas, durante os 16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência de Gênero que aconteceu em todo o Brasil. Nossa proposta, enquanto coletivo, foi conversar com as mulheres sobre o feminismo, as contribuições para o fim da violência de gênero e conversar sobre alguns mitos sobre o feminismo.
No entanto, eu senti um incômodo ao pensar de que maneira chegaria nessa conversa sem ficar naquele clima de monólogo. Daí lembrei da Oficina da Boneca Waldorf que participei com a Nina Veiga em 2016, em que costurávamos ao mesmo tempo que refletíamos sobre a infância. As reflexões profundas que tive naquela oficina me acompanham ainda hoje, me ajudando a (re)pensar a infância. Pensei, então, em organizar uma oficina de bordado, não com a pretensão de dar aulas, mas de compartilhar pontos de bordado e pontos de vista a partir do feminismo.
Começamos as conversas, entre escolhas de fios e agulhas, ao cortar o tecido e esperar para usar a tesoura compartilhada. A conversa foi fluindo, os rostos desconfiados iam se abrindo, soltando risadas e piadas. Conversamos sobre a violência que as mulheres sofrem, sobre o mito de que mulher “gosta” de apanhar e o mito de que as feministas só sabem reclamar dos homens.
Muitas só observavam pensativas.
Algumas já sabiam bordar, outras não bordavam há anos, outras sempre quiseram aprender. Eu vi ali mulheres ensinando umas às outras, inventando seu próprio modo de bordar, refazendo porque não tinham gostado. Eu vi meninos e meninas se interessando pelo bordado, unidos pela amizade e vontade de aprender juntos enquanto escutavam as conversas. Um dos meninos participou de quase todos ao dias e no final já estava ajudando as outras pessoas que estavam com dificuldades.
Muitas pessoas gostaram tanto que me perguntaram quando eu iria voltar. Disseram que aquela tinha sido uma tarde muito boa e diferente. Voltei pra casa pensando qual teria sido o motivo ou os motivos para a oficina ter agradado tanto, pois não imaginava que seria tão bem aceito.
Ao ler um trecho do livro “O Ativismo delicado – Uma abordagem radical para mudanças”, de Allan Kaplan e Sue Davidoff, tive a compreensão:
“Como um ativista pode trabalhar com tal complexidade, com tal dinâmica viva? [...] é através do envolvimento, não é tentando mudar diretamente o mundo ou uma parte dele, mas sim prestando atenção a como o mundo é, notando como ele se expressa e então tentando envolver o mundo em um diálogo consigo mesmo (e conosco) para que ele se revele para si mesmo e assim mude por se enxergar de uma maneira diferente. Em outras palavras, encorajando a simples, ordinárias e sublime arte da conversação.”
Vanessa Wagner.
Após se formar em Fonoaudiologia, se tornou mãe e viu na maternidade um potencial imenso de transformação. Iniciou então seu trabalho de consultoria em amamentação, auxiliando também em grupos de apoio à amamentação. Ajudou na criação do Coletivo Feminista MariEllas, tendo experiências marcantes. Se envolveu ativamente na última eleição e foi nesse contexto que conheceu o Ativismo Delicado, e se identificou com esse modo de ver o mundo.